Saturday, December 06, 2014
Lucidez
Há mil dias enclausurada num cúmulo-nimbo
Há mil dias acreditava ser a nuvem o calabouço de um rico navio
onde o amor reinava incólume.
Naquele reino, mesmo claustrofóbico,
eu deveria viver e morrer.
Vi harpias e lutei contra medusas insones.
Adorei anões de gesso como se fossem Adônis de mármore.
Em meus olhos, um filme de fadiga preta e branca,
e não havia espelhos para ver minha própria face dourada.
Num gesto desesperado cortei a escura fumaça
Num estertor acordei nua na praia e o sol brilhava.
A Terra inteira canta num clamor de êxtase
E sem drama, sem lágrimas, sem orações,
monges se transformam em fadas.
Canto a música do fim de mil dias perdidos.
Monday, March 03, 2014
Segunda-feira
E tenho você aqui.
Os pássaros vão acordar daqui a pouco
e tenho o amor nos braços,
por pouco, por nada, por milagre, mas fácil.
Como um recém-nascido.
Uma canção e uma garrafa de vinho barato,
e estamos abrigados do horror da noite,
da chuva e dos entes terríveis no mundo
que nos levam a vida, que nos arrastam em pesadelos,
que nos levam em delírios, desesperos e destruição.
Aqui em nosso amor estamos a salvo.
Canta comigo, querido.
Ou cala-te e olha nos meus olhos,
enquanto colho água da chuva e asso o pão.
E em nosso leito de delírios turvos
nos encontramos nus e lúcidos,
mas embriagados de estarmos a sós,
solenes de fogo e inocente escuridão.
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