Wednesday, October 07, 2009

A Primavera




um imenso buquê
de sangrentas magnólias

só eu sei em meu silêncio
só eu as vejo, ninguém me disse

doloridas vitórias-régias
começam a se abrir no lago frio

eu sozinha pressinto a calamidade
vermelha de girassóis

um gigante balé circular
de serpentes pulsa sob o frio

só eu ouço o rodamoinho
e a tensão em seu olho imóvel

um coeso arranjo de orquídeas
no centro imenso do calafrio

só eu pressinto a calamidade
das folhas douradas de arrepio

o absurdo silêncio de cordas
afinadas no terror e no desvario

só eu pressinto, sozinha em silêncio
a chama hostil no copo vazio

Mais sonhos do Anjo




A liberdade é uma bicicleta vermelha
que derrapa na chuva.

A alegria é uma espada samurai
na parede de uma freira.

O silêncio é quando uma criança
ri na missa.

O medo é um lençol branco
que voa no trânsito.

A bondade é um bolo de fubá
que se acha no lixo.

A justiça é o Filho de Deus
morrer só e crucificado.

A igualdade é os pássaros poderem
fazer ninhos nas trombetas dos Anjos.

A perfeição é o Senhor desenhar o Universo
e com um corretivo apagar a Si mesmo.

A liberdade é uma bicicleta vermelha
que na chuva adentra a escuridão.

Ciclo Lucifer- Eu sou a Serpente


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E nada me impede
nada me impressiona

canta chuva canta chuva e cantarola
mata mosca mata mosca e mais marola

Eva dormiu sob a laranjeira
e sonhou com formigas vermelhas
que sonho estranho, Eva
que sonho estranho

não gosto de tablaturas
os gafanhotos só me oferecem hosanas
todo o tempo amanheço e troco escamas

cacatua krakatoa em lá menor
nasce o sol e morre o dia em amarelo
que diferença faz para quem come farelo?

dançam os dervixes e os curiós espreitam
é a dança lisérgica dos espaços que não existem
é a dança das marionetes brancas que nada dizem

dança do homem maluco
dança do homem faminto
dança do homem condenado

Querem teoremas? Eu os tenho todos!
Sou a relíquia dos governos arruinados!
Sou Alexandria viva, eternamente repartida
meu soro ofídico cuspo na gaita, de graça

Lua que se põe



Debaixo da árvore que ainda vive
no último vale do condado, sob chuva
deita-se um velho com um violão.
Ele carrega cartas de amantes separados
e relatos de rainhas depostas.

Se você ouvir bem no vento
que lhe chega com velocidade de anjos em guerra
vai sentir suas adagas libertando-se
e ferindo as palavras com muitos fff's e sss's
que proferem os fantasmas de oxigênio
criados pelas criaturas que mal respiram em suas agonias.

Ali estará a taça de tormento
que liberta o pássaro branco na beira da morte
Que fere o coração do moribundo
e dá o ar para o recém-nascido
Quando ainda fores nada
e quando já tiveres perecido no nada
ouvirá a entonação do cântico
que sempre esteve aqui entre zumbidos da cidade
entre ventres e nas nucas de crianças
com poderes sobrenaturais.