Tuesday, January 31, 2012

Vespertino



A hora se fez dourada do cinza.
Parece-me que vou morrer.

A tarde se fez verde do marrom.
É a última hora de minha vida.

O anoitecer se fez vermelho da chuva.
É o palpitar do fim, menos que grotesco.

Chega-me um anjo de meia-idade
e fala-me com voz de bebedor de uísque.

A chuva cessou nas mãos de um ourives
e fantasmas jovens sussurram sobre os muros.

Vozes nos lençóis do tempo,
vozes nas vozes do horror congelado.

Tarde, enlouqueço.

Saturday, January 28, 2012

Memória-nervura

Folha amarga
deslizando irresoluta
ao fundo negro prata
do vale seco.

Fio de luz
escorrega lágrimas
sobre o túmulo
onde ainda palpita uma menina.

E quente o coração
sob a pele anfíbia
e branca entre girassóis.
A máscara sem olhos
espreita.

Nervos se liquefazem
ao som de borboletas anis
alucinações latejantes
de alguém que de tanto amor
transformou-se em fumaça na chuva.

Triste a folha seca
que escorrega na solução
de água e óleo diesel
no fim da estrada
ao lado do jazigo
de uma menina
ainda meio morta.

Saturday, January 07, 2012

Leve



Leve púrpura nascente da flor que é branca.
Leves algas que se espalham com a chuva vesperal.

Marina a música de sol e lua,
voz imanente entre mariscos e céu,
canto ilustrado de partituras e iluminuras astrais.

Leve a presença na areia,
sem memórias, sem história,
sem pragas rogadas ou
inquisições amargas.
Leve a pétala e leve a cor
violeta do oceano.

Gatinhos observam a tarde,
e abrem suas bocas de sono na manhã entediante.
Olhinhos de estrela, leves as garras no parapeito.

Mas eis uma presença monolítica e noturna
brilhando no fundo da água de esmeralda
na praia, nas árvores, nas manhãs e ao meio-dia.

Cantiga de todo o tempo no corpo leve como estrelas.