Saturday, January 12, 2013

Sono, madrugada





É madrugada escusa
é tempo de escuridão
é hora de uivos nos morros
e asas contras as janelas.

Enquanto, criança,
ressonava no ninho do breu,
entre anjos esbugalhados despertei
e aos prantos te chamei,

mas, querido, nada podias,
já tinhas me dado tudo.
Há esses tempos de enfrentar morcegos
sozinha no espaço infinito

e é tudo o que existe, não há ninguém
no meio do tempo nem no quarto,
na sala ou no jardim,
somente deuses em ruínas.

E teu corpo terno e quente, tão distante
Uma roda de ciranda foi entoada por uma bruxa
na janela aberta, e ela tinha dentes podres
e olhos de baratas negras.

Enquanto isso, eu orava sobre as flores
que me deixaras, amado.
E soluçava para que despertasse, e que seu toque,
como um feitiço branco, desfizesse o terror.

Que seu abraço de primavera
me fizesse sentir além da náusea,
que sua voz branda me encantasse,
além do espanto e do lamento fúnebre.

Que sua presença me trouxesse a luz,
que seu coração tocasse uma sonata,
e que assim os pássaros-lâmina me deixassem
e que eu pudesse respirar e viver.

Mas tua canção aninhava-se
em nuvens verdes, rosadas.
Estavas envolto em poesia,
estavas imerso em êxtase.

Eu te queria anjo,
te queria guerreiro,
te queria sábio monge,
te queria leito para meu peito agonizante.

Eu te amo. E te perco entre brumas,
e música que embala barcos,
mas sei que estás comigo,
e me salvas do naufrágio entre górgonas.

Eu te amo, eu te amo,
e como mantra repito em lágrimas
no seio da madrugada aterrorizante,
e seguro tua mão, amor, na poesia e na esperança

do teu despertar.



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