Monday, February 18, 2013

Catarina e Pablo ouvem Chopin

Olhinhos fechados
no silêncio,
nas pausas de uma Berceuse,
num Noturno de flores,
nas ondas da Polonaise,
patinhas para cima,
continhas de areia,
estrelinhas do mar.



Luzinhas que caçam,
vagalumes de pensamento
pairam livres sobre as cabeças
adormecidas de Pablo e Catarina,
que em sonho perseguem moscas verdes,
e caçam gafanhotos cor-de-rosa.

Calor entorpecente em 3/4
acordes que se alternam entre
grama fresca e lágrimas quentes.
Pablo e catarina ressonam
com as patinhas para cima.

Alheios a si,
alheios ao Mal
deste imenso mundo,
pequenos deuses indiferentes
ao ódio humano,
à luta egocêntrica, à sujeira das máquinas
e da burocracia de papel.
Pablo e Catarina sonham
com fadinhas-vagalume para serem caçadas
na invenção de um triste senhor polonês.

Tuesday, February 12, 2013

O pistoleiro

                                                Fotografia de Jan Saudek




Encontra-me à janela numa tarde de flores vermelhas,
janela de madeira comida pelo tempo e outros pássaros vorazes.
Caminha tranquilo, em paz com suas armas, na calçada de escorpiões.

De camisa branca vem o meu amor,
com rosas na mão direita,
e uma adaga na cintura. Seus olhos vermelhos
de sangue derramado de patrões exploradores,

pois ele é o justiceiro dos humildes, dos camponeses,
dos índios, das escravas negras abusadas pelos senhores brancos.
Ele é dançarino, jogador, príncipe dos sem lei esquecidos nas tavernas.

Um anjo de olhos negros que vem me visitar,
íncubo de sonhos de ninfas virgens sequestradas,
protetor de pássaros, companheiro de lobos,
amante que abre minha alma como uma flor de lis na manhã de outono,

irmão que estende seus braços para aninhar-me em seu peito,
onde sinto bater seu coração constante,

amor de séculos passados enclausurados no escuro,
de chuva do futuro que pende na montanha,
da música de um violino adormecido no presente.





Monday, February 11, 2013

A hora do lobo



Na hora do espanto e do terror
na hora da chuva fria, da humana solidão
da qual não me arremedo, da qual não fujo,
pois sou filha da escuridão, sou filha do frio,
sou filha da tempestade que traz ressaca no mar,
e filha da lama na ruela onde
traficantes vendem seus sonhos sujos.

Na hora triste em que doentes morrem de abandono,
e que cachorros cheios de amor uivam por seus donos mortos,
na hora em que gatos, os divinos, emitem suas palavras de amor,
e se esquivam errando no vazio estrelado,

estou bem acordada e à espreita.
Estou, felina, alucinada, escrivã, musicista,
estou, madrugada, inteira.
Sem café, sem estimulantes moleculares,
sem diapasões, sem luminárias,
estou inteira, à espreita, na chuva,

com uma lança mortal
na esquina.

Sunday, February 10, 2013

Amor e outras fantasias




Ei-nos no laboratório,
vidros, venenos, ácidos azuis
e outros brinquedos de adultos.
Nossa vida, nossos silêncios,
nossas histórias de pin ups
e lentes vermelhas,
nossos cânticos e drinks evangelizadores.

Descobrimos todo dia na grama verde
insetos transparentes, vaga-lumes que são estrelas.
Momentum e posição indefinidos,
álgebra não-comutativa sobre esquemas
parametrizados por dois loucos.

Amor, vestes-me como fantasia real,
e te visto durante o dia, à noite, pela madrugada
como se fosses a luva constante
que uso em meu trabalho diário
e minucioso de redescoberta
da fauna e da flora da existência.

Nossa vida, nosso jardim,
nosso laboratório de pensamentos, risos,
carícias e viagens, de toques e animais marinhos,
o parapeito das janelas, os gatos à espreita,
as velas, as taças, a água que escorre,
a nossa música.

O primeiro pensamento na alvorada,
a última lembrança ao adormecer.


Sunday, February 03, 2013

Vampiro II

                                   Dark angel rising, de Neil A. Pike



Escuro dia que sucede
uma noite cintilante,
um corpo pulsante,
uma flor arfante.

Febre vermelha desata,
capa de seda negra.
Letras num manto de ardor anil
literatura do desejo preso num covil.

Arca de vontades,
bondes de crueldades de amor
lustres e meias rendadas,
taças a ponto se serem quebradas.

Amor que pulsa numa gruta,
sem ser visto e, de repente,
explode enlouquecido,
mas imenso e divino, luta

para ser visto e bendito,
por seu amado, precisa de sangue
e se espalha eterno e real,
frágil e em movimento, como o espaço sideral.

Luz vermelha na rua suja,
e vejo morcegos e gatos no breu.
Esta que se equilibra de corpete sou eu,
sob a lamparina de querosene.

No meio do Destino atlântico,
no caos da tempestade de deuses hindus,
fúria e vazio de nossos teares de vida,
meu amor surge tecido, vestido, painel, mural,

e desejo universal.