Não bebo água suja.
Durmo onde quiser e mantenho-me
impecável e elegante todo o tempo.
Não ando com multidões.
Não tenho medo de altura
nem da solidão. Durmo nos parapeitos
no alvorecer de dias brancos.
A noite é minha casa, busco o escuro
e os muros das ruas de madrugada.
Não gosto de todos. Observo-os
e reconheço as mãos dos ímpios
e dos brutos, e dos impuros.
Não me submeto.
Mantenho a fronte bem desenhada esquiva
e os olhos transparentes na espreita.
Mas tudo é calma e segurança
como os equilibristas de circo
e os silenciosos guerreiros zen.
Desperto do sono absoluto sem sonhos
para a ação imediata, corpo flexível,
olhos bem abertos e garras estendidas.
Antecipo-me ao medo e vôo na rapidez
do pensamento, antes que a presa corra,
antes que o impuro me lance água quente.
Entretanto, a sutileza do medo não subtrai meu prazer.
Estamos sóbrios e altivos na inteireza da vida,
mas elegantemente à parte,
sobre os muros e sacadas,
espreguiçando-nos nas camas,
e mantendo distância dos torpes.
Somos sempre belos e delicados.
Não bebo água suja.
Não tenho medo de altura.
Minha solidão é minha sombra.
2 comments:
Mandei esse poema para minha irmãzinha que mora em Brasília. Ela adora os gatos dela e adora poesia. Muito bom, Cecília!
Bb, tou sofrendo pra conseguir comentar no Blasé.. só rola depois de muita tentativa... mas, tou conseguindo.
Beijocas!
De fato, é um poema sobre felinos mas também e confessional. Identifico-me mais com eles do que com a maioria das pessoas... ;)
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